O Falso Suicida

Eu queria conseguir algum tipo de veneno
Que me matasse só por um momento,
E me desse a ilusão de que eu de fato fiz
Algo drástico, ao menos uma vez na vida.
Mas isso não existe, e aqui estou eu, cercado
De centenas de coisas fúteis e mesquinhas,
Preso a um mundo mesquinho, impossível escravo
Sem ter um opressor contra o qual revoltar-me.

Essa a pior angústia: a que existe sem nome,
E que dentro de nós insiste em não parar
De doer como vidro moído nas veias.
E ninguém tem coragem de admitir:
Parar é abrir os olhos e ver o que se teme.

E eu não sou diferente de ninguém.
Tenho o mesmo desgraçado medo
De olhar e não ver nada que me ajude
A acreditar em mim.

Posso ver os carros daqui da janela.
Passam rápidos pela avenida. Vão a algum lugar?
Não mais do que os pensamentos desencontrados
Dos que os conduzem, que não sabem aonde vão.
Vão rápidos, de qualquer forma. Talvez a velocidade
Preencha com emoção o rumo que lhes falta
E ajude-os a não ter consciência do vazio.
O tráfego é o sentido que lhes resta,
Se se pode chamar sentido ao movimento.

Essa a pior ang�stia: saber-se sem sentido,
E continuar vivendo por n�o ter alternativa.